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O protagonismo de Margaret Thatcher

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Margaret Thatcher ocupou o cargo de primeira-ministra do Reino Unido entre 1979  a 1990, por três mandatos consecutivos. Foi a primeira-ministra com o maior período no cargo no século XX, e a primeira mulher a ocupá-lo. Seu governo caracterizou-se pela defesa e implementação de diversas propostas liberais que visavam recuperar a economia britânica da estagnação que marcou os anos 1970. Dentre elas, constavam a redução do tamanho do Estado e o incentivo ao livre mercado tendo como princípio fundamental o foco no cidadão, quem deveria ser visto como o cliente dos serviços públicos.

Paper – Forum PROTAGONISMO

Na década de 1970, o Reino Unido enfrentava grave recessão econômica devido aos choques do petróleo. O país, assim como toda a Europa, experimentava alto índice de desemprego e, ao mesmo tempo, elevadas taxas de inflação. Margaret Thatcher, então, foi eleita por se opor às ideias predominantes do Estado de bem-estar social e de uma economia centralizada com intervenções governamentais constantes na definição de preços e quantidades. Thatcher foi eleita para tirar o peso do Estado das costas do cidadão.

QUEM FOI MARGARET THATCHER?

“Homens fortes criam tempos fáceis, tempos fáceis geram homens fracos, homens fracos geram tempos difíceis e tempos difíceis geram homens forte.”

Como disse Harold Wilson3 sobre Thatcher: “é o homem mais duro que já tivemos”. Apesar do enorme sucesso político e das transformações que realizou no Reino Unido e no mundo com suas ideias solidamente fundamentadas, Thatcher teve uma infância pacata e simples.

Margaret Hilda Roberts nasceu em 13 de outubro de 1925, em Midlands, Inglaterra. Seu pai, Alfred Roberts, possuia uma pequena mercearia da cidade. A família Roberts vivia na parte de cima da mercearia. Com uma vida muito simples, Margaret dedicou-se aos estudos e ao hóquei e, assim, conseguiu acessar a faculdade Oxford, onde cursou Química e se tornou membro da Associação de Conservadores de Oxford. Formou-se e trabalhou brevemente na área. Aos 23 anos, sua vida tomou outro rumo: Margaret se candidatou a um cargo eletivo. Nessa oportunidade, ela não se elegeu, mas durante a corrida eleitoral conheceu Dennis Thatcher, que mais tarde se tornaria seu marido, e começou a cursar Direito. Daí em diante, a carreira política passaria a ser um ponto central da sua vida.

A DAMA DE FERRO4:1, PROTAGONISTA NA LUTA PELA LIBERDADE

Ao longo de seu período como representante no Parlamento, bem como no cargo de primeira-ministra, Margaret Thatcher combateu o Estado de bem-estar social britânico5. Para ela, o cidadão deveria ser o protagonista de suas próprias escolhas, e não um Estado paternalista todo-poderoso6.

Thatcher viu o declínio do Reino Unido de grande potência nos séculos XVIII e XIX para uma sociedade decadente em que os cidadãos mais se preocupavam com o que gostariam de receber do governo do que com o que poderiam contribuir para o país. Segundo Thatcher, sua missão era transformar o Reino Unido de uma nação “dê para mim” para uma nação “faça você mesmo”, acabando com a esclerose institucional.

A definição de “esclerose institucional” está presente na obra The Rise and Decline of Nations, do economista institucionalista Mancur Olson (1984). Ele explica os motivos da grande divergência de crescimento entre os países vencedores da Segunda Guerra Mundial, como a Inglaterra, e os perdedores, como Alemanha e Japão.

Apesar de diversos autores demonstrarem a importância da tecnologia, acumulação de conhecimento e capital para o desenvolvimento sustentável das nações, somente esses três fatores não conseguiam explicar toda a divergência.

A esclerose institucional ocorre quando as instituições ou os grupos de uma sociedade atingem um nível de poder que pode inibir ou impedir a destruição criativa necessária para a inovação e o aumento de produtividade. O autor aponta que, em países nos quais os grupos de interesses são maiores e mais influentes, maior é o uso do poder político para privilegiar pequenas minorias em detrimento da coletividade. Tudo isso tenderá a reduzir sua capacidade de crescimento e desenvolvimento econômico. Adicionalmente, Olson destaca que os países vencedores da guerra possuíam maior estabilidade econômica e política, o que fez com que os grupos de interesse se multiplicassem para buscar privilégios. Assim, o “engessamento” da economia ocorreria devido ao excesso de grupos de interesse.

É neste cenário, com altas taxas inflação e baixas taxas de crescimento, com forte poder dos sindicatos, greves, alta taxa de desemprego, baixa inovação, crescimento econômico vacilante e esclerose institucional8, em que Margaret Thatcher chega ao poder. O tamanho do desafio é grande, assim como a vontade de Thatcher em vencer a batalha contra os grupos de interesse e restaurar o Reino Unido. Por toda a sua dedicação à causa da liberdade durante a sua gestão, a revista The Economist a homenageou quando de seu falecimento:

A VITÓRIA NA GUERRA FRIA

A Guerra Fria foi um período marcado pela disputa de poder e influência entre o bloco capitalista, liderado pelos Estados Unidos, e o bloco comunista, liderado pela União Soviética. Foi marcado por guerras entre países menores em que cada um dos lados recebia o apoio de uma das potências, além de disputas não só militares e tecnológicas, como também aeroespaciais e esportivas, com os países alçando voos cada vez mais altos no espaço e travando batalhas pelo topo nas Olimpíadas.

Margaret Thatcher foi, junto com Ronald Reagan e o Papa João Paulo II, uma personagem central no combate e na vitória contra o bloco soviético. Os três eram considerados os líderes do mundo livre.

Apesar das diversas frentes de batalha, a Guerra Fria foi vencida com muita diplomacia e trabalho nos bastidores, com uma grande disputa pelos corações e mentes do povo. Thatcher foi central no processo, como uma grande defensora não apenas da economia de mercado, mas dos valores da liberdade e da democracia.

REFORMAS, IMPACTOS E DADOS9 A PRIVATIZAÇÃO DA ECONOMIA BRITÂNICA

Thatcher foi fortemente influenciada pelas ideias liberais e, quando eleita, tratou de implementá-las, especialmente as que se referiam às reformas econômicas.

Conta-se que, em uma reunião com seus ministros, Thatcher tirou da bolsa um livro de Friedrich von Hayek, pôs em cima da mesa e disse: “esse é o nosso programa de governo”10. O caso ilustra o comprometimento da Dama de Ferro com a implementação dos ideais que defendia.

Em um contexto de deterioração econômica dos anos 1980, com inflação e desemprego simultaneamente em altos níveis, um dos pontos cruciais de sua política foi tirar as atividades produtivas do controle direto do Estado por meio de privatizações, a fim de aumentar a competição e a eficiência na alocação de recursos. Seu governo foi marcado pelo aumento das privatizações:

Segundo a ONS, foi a maior operação de privatização já vista, arrecadando 29 bilhões de euros para os cofres públicos. O governo Thatcher influenciou países de todo o mundo, especialmente seus vizinhos europeus e países asiáticos.

Thatcher privatizou grandes empresas e setores inteiros, como a estatal de telecomunicação British Telecom, a companhia aérea British Airways, as automobilísticas Rolls-Royce e Leyland, partes da British Steel, bem como aeroportos e empresas dos setores de energia como petróleo, gás, hidrelétrica, energia elétrica e nuclear.

Mesmo após deixar o governo em 1990, a influência de Thatcher permaneceu e diversas empresas foram privatizadas, incluindo o Royal Mail (similar aos Correios), fundado em 1516.

As privatizações são consideradas um dos maiores legados do governo Thatcher. Foram responsáveis por alterar drasticamente o perfil da economia britânica. Margaret adotava a visão tradicionalmente liberal de que a gestão estatal de uma empresa é profundamente influenciada por interesses políticos e eleitorais, sem qualquer garantia de que os recursos gerados serão reinvestidos de maneira apropriada, com a motivação correta do lucro. Ou seja, diferentemente da gestão privada, que busca gerar mais rentabilidade e produtividade, de modo a elevar a competitividade e melhor satisfazer o consumidor.

O COMBATE À INFLAÇÃO E O RETORNO DO CRESCIMENTO ECONÔMICO

A meta central de seu governo era a redução da inflação. Margaret foi contra o suposto “consenso” keynesiano adotado no mundo capitalista e, portanto, além do plano de privatizações, buscou atacar a alta inflação elevando as taxas de juros. Nesse sentido, a taxa de juros subiu de 6% em 1979, para 10,25% em 1980. No início de seu governo, em 1981, chegou aos 14%12. A diminuição do incentivo ao investimento em função de uma taxa de juros mais elevada foi o preço que a primeira-ministra escolheu pagar para conter a inflação que estava fora de controle. Ela conseguiu que o índice baixasse de 15,1%, em 1980, para 3,7%, em 1986, durante o seu segundo mandato, segundo os dados do FMI.

Ainda assim, apesar da dificuldade e do aumento de juros para conter a inflação, a taxa de crescimento do Reino Unido que era menor do que a da União Europeia nos anos 1970, passou a superá-lo nas décadas de 1980 e 1990.

Com o foco em combater a inflação, a recessão na economia britânica continuou, com o PIB encolhendo 2% enquanto o restante do mundo subiu 1,9% em 1980. Não obstante, mesmo com a alta de juros e o desincentivo ao investimento, o crescimento acumulado do PIB durante o governo da Dama de Ferro foi de 33% na década de 1980, comparado com 23% na década de 1970.

Além da política monetária restritiva, o corte acentuado dos gastos governamentais também foi essencial para reduzir a inflação. Uma das mudanças foi trazer métodos de gestão do setor privado para o setor público.
Thatcher impulsionou o desenvolvimento da chamada “Nova Gestão Pública”, cujas primeiras ondas buscavam valorizar o cidadão como cliente e o aumento da eficiência do gasto.

Adicionalmente, o governo Thatcher introduziu limitações financeiras principalmente para despesas com serviços sociais como habitação e educação. Apesar da despesa geral em sua gestão ter aumentado 13% em seu governo, o peso do Estado diminuiu seu peso sobre a economia, uma vez que o PIB cresceu muito mais na década. Segundo o FMI, o percentual de gasto público caiu de 40% em 1979 para 26,5% do PIB em 1990. Esse foco na responsabilidade fiscal possibilitou que a condição fiscal do Reino Unido passasse de déficit para superávit no fim do governo, operando por dois anos no azul. Essas políticas podem ser representadas por uma de suas frases mais famosas: “Não existe dinheiro público. Existe apenas dinheiro do pagador de impostos”.

A BATALHA CONTRA OS SINDICATOS

Margaret Thatcher foi um exemplo de redução do intervencionismo, por meio de políticas em prol do mercado livre e regulamentações mínimas, a fim de impulsionar empreendedores a expandirem suas empresas e criarem empregos. Uma das ações nessa direção foi controlar o poder dos sindicatos, impondo limites de greves, instauração do voto secreto para maior proteção de seus membros, e flexibilização na relação entre empregado e empregador. Os sindicatos também passaram a responder legalmente por suas ações, podendo sofrer processos judiciais.

Durante o seu governo, houve um declínio acentuado na densidade sindical, com a porcentagem de trabalhadores pertencentes a um sindicato caindo de 57,3%, em 1979, para 49,5%, em 1985. Desde 1979 até o último ano de Thatcher no cargo, a adesão sindical também caiu, de 13,5 milhões para menos de 10 milhões. Uma medida impopular, mas que não foi desfeita pelos governos seguintes.

Em uma entrevista no Brasil, Margaret Thatcher sintetiza sua opinião sobre o papel do Estado: “O governo precisa manter sólidas as finanças do país. É a primeira função do governo. Precisa ser capaz de manter a inflação baixa e manter o crédito circulando. A segunda é cuidar da segurança nacional. E a terceira, oferecer um sistema educacional decente. O cidadão comum só poderá ascender na vida se receber uma boa educação, independentemente de sua classe social”.

LÍDERANÇA BASEADA EM PRINCÍPIOS E VALORES

Para ter sucesso em um cargo tão importante por tanto tempo, Thatcher precisou quebrar barreiras e estruturar uma liderança capaz de amparar sua postura liberal. Para tal, a primeira-ministra precisou ser protagonista de um novo capítulo da história do Reino Unido, uma história baseada em valores sólidos: Liberdade, Excelência e Integridade.

Margaret agiu como guardiã da liberdade de seus cidadãos, e não à toa ficou conhecida como Dama de Ferro. Ela não temia o ataque da oposição e nem a perda de popularidade, por isso tomou decisões duras como o corte de gastos públicos. Além disso, executou suas ideias com excelência, tendo um plano de governo muito sólido.

Apesar de ter assumido o poder em um cenário de grave crise política e econômica, a ministra soube lutar e aprovar as mudanças que defendia: privatizou dezenas de estatais, reduziu a inflação e as despesas públicas, diminuiu a intervenção da economia, limitou a força dos sindicatos e fez com que a responsabilidade fiscal se tornasse um valor perseguido por governos de diversas partes do mundo. Essas medidas entregaram resultados sólidos e influenciaram seus sucessores.

A Dama de Ferro era símbolo de integridade e honestidade. Buscando sempre separar o certo do errado, demonstrando forte inteligência emocional diante dos maiores desafios políticos, econômicos e militares, honrou seus valores e ideais, tornando-se, portanto, protagonista da sua história e da história de sua nação. Thatcher chamou para si a responsabilidade de recuperar o país por meio de uma liderança baseada em valores que contradiziam muito do que se acreditava na época. Sua disciplina, persistência e perseverança a permitiram cumprir suas promessas e atingir suas metas.

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